[edição 39 | tempo de leitura: 5 minutos]
quando me dão um cardápio cheio de opções, minha primeira reação é procurar o prato mais parecido com algum que já comi.
alguns acham um crime… mas eu tenho esse problema na hora de experimentar comidas novas, sempre vou no conhecido.
são raras as excessões à regra.
só abro mão daquela mesma opção que escolho há anos quando:
alguém que me conhece bem indica um prato com a frase: "tenho certeza que vai gostar”, ou quando vejo um review nas redes sociais que me dá água na boca.
pois é, só confio em alguém muito próximo ou em um completo desconhecido com muitos likes.
o mundo moderno é mesmo complicado.
“a globalização encurta as distâncias do mundo”.
foi mais ou menos o que meu professor de geografia me respondeu quando perguntei, lá pela quinta série, o que significava essa palavra que vivia se repetindo nas apostilas.
em algum momento, eu entendi que os filmes americanos da sessão da tarde tinham algo a ver com isso, assim como os produtos que estavam, ao mesmo tempo, nos filmes gringos e nas prateleiras do mercadinho da vila onde eu morava, e que os aviões que levavam pessoas de um país para o outro também eram parte dessa história toda de "mundo globalizado".
a globalização era a responsável por levar o mundo todo até a minha sala ao mesmo tempo em que podia levar meu corpo para passear no mundo.
e, eu sei que o impacto de tornar o mundo mais global e menos local abrange muita coisa, mas, como uma amante de viagens, uma parte dessa história sempre me chamou mais atenção:
o turismo.
é como se a globalização tivesse transformado as possibilidades de viagem em um menu gigante. e eu, sem saber muito bem para onde ir, recorro ao método que uso em todo restaurante: ou vou no de sempre ou no que alguém me indicou.
mas só ao conhecer um destino bem famoso nas redes sociais ao vivo é que cai a ficha de que cada like embaixo da foto é, de fato, uma pessoa de verdade.
e, se existe uma certeza, é a de que elas estarão todas lá.
na fila de cada atração, no trânsito das cidades, na sala de espera dos aeroportos lotados e, principalmente, naquele lugar disputado para tirar a foto perfeita.
o desconforto na lista de destinos preferidos já é tanto que, cada vez mais, residentes pedem para que os turistas não visitem sua cidade de formas nada amigáveis.
em julho, vi isso de perto.
enquanto estive em Barcelona e me dividia entre estudante em sala de aula e turista nas ruas, bares e praias da cidade, não pude deixar de notar a quantidade de graffitis espalhados pelos bairros repetindo a mesma ideia:
“tourists, go home!”
"turistas, voltem pra suas casas!”
eu, habitante de um país onde o turismo é visto sempre como um bem a ser perseguido e um gringo (com suas moedas valorizadas) é recebido com simpatia e serventia, me senti confusa ao ler aquelas palavras.
como o turismo, que tem como maior fruto o dinheiro que pessoas do mundo todo guardam para depositar em seu país, pode ser sinônimo de algo ruim?
eu não consegui responder essa pergunta porque ela está errada.
o turismo não é ruim.
mas o excesso de turismo pode ser.
em um mundo tão grande e e globalizado, com um cardápio quase infinito de opções, porque continuamos indo todos para os mesmos lugares?
seja pela foto bonita, pela quantidade de vôos disponíveis, pela praticidade do trajeto, pela indicação do influenciador com milhões de seguidores ou, simplesmente, pelo prazer de dizer “eu já fui até lá", o fato é que estamos todos passando as férias nos mesmos lugares, e os países mais visitados do mundo não aguentam mais receber visitas (e farão o possível para nos manter longe).
de um lado: turistas dispostos a gastar o que for para realizar o sonho de conhecer um lugar famoso.
do outro: moradores revoltados com os altos preços de comida e moradia dessas cidades cada vez mais feitas para turistas, além da disputa diária de espaço no transporte público, nas ruas e nos espaços de lazer com tantos visitantes que vem, tiram fotos, e vão.
as medidas dificultando o turismo em lugares historicamente turísticos são sinais*
*sinal: quando falamos de previsão de futuro, um sinal significa uma evidência ou indicador de que algo está mudando. vários sinais juntos formam uma tendência de algo que pode vir a acontecer no futuro.
🔎 em setembro deste ano, o Airbnb proibiu reservas em Nova Iorque
🔎 países da Europa têm criado ou aumentado taxas para as visitar cidades ou pontos turísticos mais disputados
🔎 restrições de lazer ou vida noturna estão sendo intensificadas como forma de desencorajar turistas
🔎 movimentos populares dizem com todas as letras "turistas, voltem para casa!”
com tantos sinais apontando na mesma direção, novas perguntas surgem:
🕵🏼♀️ será esse o começo da formação de uma nova lista de destinos preferidos que não incluem os famosos países europeus?
se isso acontecer, quais pontos turísticos substituirão a Sagrada Família, o Coliseu, e a Torre Eiffel nos novos destinos favoritos dos turistas?
🕵🏼♀️ ou, será que os algoritmos das redes sociais vão dar conta de diversificar nossas escolhas e ajudar a resolver o problema de todo mundo querer se fotografar nos mesmos lugares?
se isso acontecer, como as companhias aéreas vão reagir e se adaptar à mudança na procura por destinos?
quaisquer que sejam as respostas, todas indicam a mesma coisa: estamos no início do fim do turismo como conhecemos.
📂 dica: os links compartilhados por aqui ficam salvos e organizados por tema no banco de teorias, o acervo de links da teoricamente :)
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o que os turistas de barcelona acham dos sinais de "turistas, voltem para casa”? um vídeo curtinho com vários pontos de vista, para assistir e refletir sobre essa questão nada simples:
☝🏼 o tema da última edição deu o que falar no LinkedIn, se quiser participar da discussão é só se juntar com a galera nos comentários, clicando aqui. se ainda não leu, essa é a hora:
👩🏼💻 A Teoricamente é escrita por Leticia, profissional de comunicação sempre estudando sobre futuro, comportamento e narrativa. Você pode me encontrar no LinkedIn, no Instagram e agora no Tiktok também (com mais frequência do que deveria).
Lê, vc se sentiu segura caminhando, passeando e tomando táxi na cidade? Pq, aqui na Argentina, as vezes não me sinto.
E sabe que esse seu relato me deixa triste pq eu nunca viajei para esses "pontos turisticos tradicionais", mas agora dá um medinho planejar viajar. hehe
Que xuxu de edição Lê, amei amei amei, sensacional! <3