Essa edição é uma carta de amor à amizade verdadeira. Aquela que, na adolescência, cheguei a pensar que nunca fosse experimentar e que anos depois encontrei, sem me dar conta, na minha mãe, na minha irmã e em duas amigas que a vida se encarregou de me apresentar. Afinal, quem são as pessoas que nos ajudam a construir a narrativa da nossa própria história?
Em alguma noite no fim de Janeiro, sentada em um banco improvisado da estação de metrô Faria Lima, em São Paulo, esperando minha amiga (como de costume atrasada) um filme tomou conta dos meus pensamentos.
Nele, a personagem principal sou eu, com 21 anos, descobrindo a vida noturna, a graça de virar a noite nas baladas e a liberdade de sair com as minhas duas grandes amigas em passeios sem roteiro definido, que podiam começar na Rua Augusta e terminar na Luz, ir até a Sé em plena madrugada e desembocar em alguma festa de faculdade com bebida barata de qualidade duvidosa.
Nós três, sem grandes pretenções a não ser dançar a noite inteira.
Foram nessas noites que eu descobri o que era a dança de verdade. Esses movimentos involuntários que o corpo faz sem a preocupação de quem olha de fora. O ritmo que o próprio corpo aprende enquanto escuta a música. A dança virou, para mim, uma expressão de felicidade máxima.
Com elas eu dancei nas noites mais quentes do ano, e nas mais frias também.
Entre uma dança e outra, aprendemos juntas tudo o que sei sobre amor, feminismo, ancestralidade, empatia e todas essas outras palavras que nos fazem cavar fundo até descobrir quem somos.
E em cada conversa antes de dormir, nas poucas horas que tínhamos antes do dia clarear, aprendi um pouco mais sobre o que é ser mulher no mundo. Sobre elas. Sobre mim.
Depois de tantos anos, mudamos de empregos, de carreira, de endereço, de sonhos. Depois de tantos anos, tanto mudou. As distâncias se alongaram e, nas bifurcações da vida, tomamos caminhos diferentes. Mas, assim que a música toca, ainda dançamos como se fosse 2019.
Eu, que venho de uma família de muitas mulheres com poucas amigas, comecei a refletir a pouco tempo sobre as minhas amizades femininas.
No jardim de infância, minha melhor amiga sempre dividia o lanche favorito dela comigo e, por isso, ele se tornou o meu favorito também.
O chá de cravo que minha mãe fazia sempre que eu me contorcia em cólicas é ainda o único que cura minhas dores.
Continuo passando maquiagem do jeito exato que minha irmã me ensinou muitos anos atrás.
Sou feita das coisas que aprendi com outras mulheres. Quando me dei conta disso, muito mudou. Passei a enxergar minhas relações femininas com lentes diferentes.
Eu, que cresci acreditando que era um ser individual, sou cada dia mais lembrada que minha natureza é coletiva.
Enquanto nós, mulheres, passamos a adolescência rivalizando umas com as outras, incentivadas pelos filmes em que duas garotas brigam pela atenção do mesmo garoto ou pelos concursos de beleza com apenas uma vencedora, os meninos crescem elogiando outros homens, endeusando jogadores de futebol, se exercitando juntos, marcando compromissos entre amigos com frequência certa e garantindo assim a manutenção de amizades que têm um lugar privilegiado em suas vidas, amizades que permanecem acima de qualquer relacionamento amoroso.
Os homens são ensinados desde cedo a amar outros homens. Mas ninguém nos ensina como fazer o mesmo entre mulheres.
Cabe a nós, mulheres, aprender a nos amar.
Aos 25 anos, sinto que deveria conhecer tudo sobre o mundo, ou pelo menos tudo sobre o mundo que existe dentro de mim, mas não é bem assim. O autoconhecimento é um labirinto mais longo do que imaginei que seria e, a cada dia que passa, entendo que só sairemos dos nossos labirintos juntas.
teoria para se aprofundar
“Coletivizar os nossos sentimentos faz com que a gente não se sinta culpada”, Podcast Bom dia, Obvious
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“Com qual informação contamos sobre como nós mulheres nos relacionamos? Se repassamos brevemente os contos tradicionais, encontramos aí mulheres que não podem conviver em harmonia”, Revista Az Mina
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As atrizes Joan Crawford e Bette Davis, conhecidas como protagonistas da maior rixa de Hollywood, foram incentivadas a serem rivais durante a vida inteira. Quem estimulava esse ódio e lucrava com as fofocas nos jornais eram os estúdios (comandados por homens, é claro). A história real virou tema da série Feud.
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para se inspirar
“(O vôlei) é uma modalidade coletiva, de apoio, e de suporte entre as atletas e isso não poderia ser mais a nossa cara. Afinal, não existe nada mais poderoso do que uma mulher apoiando outra.” Essa reflexão sobre o patrocínio da Bianca Andrade aos times de base do vôlei feminino do Corinthians faz a gente refletir sobre construção de marca bem feita.
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Quem são as pessoas que lembramos quando conquistamos os nossos sonhos mais grandiosos? O discurso do Ke Huy Quan no Oscar me fez pensar muito sobre isso.
links que valem o clique
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Oi!
Terminei essa edição sem ter muita certeza se fui clara o suficiente sobre minha necessidade repentina de cultivar as amizade femininas que eu nunca fui encorajada a ter.Seja você homem ou mulher, espero que esse texto tenha te incentivado a olhar para os lados e enxergar, de verdade, quem está te ajudando a atravessar o labirinto da vida.
Até quarta que vem :)
Le
o que rolou na edição anterior
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👩🏼💻 A Teoricamente é escrita por Leticia, profissional de comunicação sempre estudando sobre marca, comportamento e narrativa. Você pode me encontrar no LinkedIn, Instagram e Twitter (com mais frequência do que deveria).
Amei a leitura, li recentemente um livro chamado Kim Jiyoung, nascida em 1982 e o seu artigo faz um link muito bom com o a história do livro, sobre se reconhecer em outras mulheres e enxergar elas em si mesma. Ansiosa para a leitura dessa semana
Adorei esse, Le <3 Estar rodeada de outras mulheres cura feridas que eu nem sabia que existiam. Tenho me esforçado para cultivar e manter essas coisas que me fazem bem e me deixam mais forte pra enfrentar a vida. Obrigada por compartilhar!