[edição 42 | tempo de leitura: 5 minutos]
enquanto crescia, nunca conheci uma mulher relaxada.
mulheres de sucesso? sim.
mulheres produtivas? bastante.
mulheres ansiosas, com medo e que pedem desculpas? várias delas.
mas… mulheres relaxadas? mulheres à vontade? mulheres que não dividem seus dias em intervalos de meia hora de produtividade? mulheres que se dão permissão incondicional para relaxar – sem culpa, sem desculpas, sem sentir que precisam merecê-lo?
não tenho certeza se já conheci uma mulher assim,
mas eu gostaria de me tornar uma.
o trecho aí de cima é a tradução aproximada de um texto que apareceu na tela do meu celular por dias e dias, no story de mulheres diferentes que, assim como eu, se viram nesse relato que soa como um grande desabafo.
a dona dessas palavras é Nicola Jane Hobbs, que se define (entre muitas outras coisas) como uma pesquisadora do estresse e do descanso. em 2022, Nicola fundou a The Relaxed Woman, uma plataforma com guias e cursos para que as mulheres consigam relaxar:
nossa filosofia está enraizada em deixar nossos corpos e cérebros saberem que estamos seguras o suficiente para relaxar, que somos dignas o suficiente para relaxar.
dignas de relaxar.
em 2023, a sobrecarga foi apontada como a segunda principal causa de ansiedade, depressão ou algum outro transtorno mental entre mulheres brasileiras, ficando atrás apenas dos problemas financeiros.
⤴🔎 falamos sobre isso na edição #38 - comemorar o futuro
essa é uma boa maneira de dizer que não é à toa que não relaxamos. simplesmente temos coisas demais para fazer e com o que se preocupar, certo?
mas, não é só isso.
a sensação que temos é de que nunca mais daremos conta de tudo o que precisamos e queremos fazer, vivemos em um relógio diferente do dos nossos pais nos anos 1980 e 1990. eles tinham um tempo mais coletivo, existia uma rotina coletiva, as pessoas trabalhavam mais parecido, das nove às dezessete.
⤴🔎 falamos sobre isso na edição #9 - tudo o que me ensinaram sobre trabalho
esse trecho, do livro Aurora: o despertar da mulher exausta, reflete como nossa busca pela produtividade e pelo sucesso tenta vencer um concorrente de peso: a jornada dos nossos pais, que conquistaram seus bens em uma sociedade completamente diferente, com outras rotinas de trabalho, outra economia e outras prioridades.
estamos correndo atrás do tempo (aparentemente) perdido,
das metas que queremos alcançar antes dos 30,
do emprego dos sonhos,
da casa própria,
da vida social badalada,
do carro do ano,
do feed do Instagram com fotos de viagens,
da boa relação com os nossos pais,
das velhas e novas amizades,
de um relacionamento duradouro de sucesso.
e tudo isso sem esquecer de se exercitar até conquistar o corpo dos sonhos,
de manter o guarda-roupa na moda,
de cuidar da pele,
de fazer as unhas,
de se depilar,
de hidratar o cabelo…
essa lista poderia continuar por muitas e muitas linhas.
se estamos coletivamente tão cansadas, porque é tão difícil se permitir descansar?
o livro também abre espaço para outra ideia:
a necessidade não só de trabalhar, mas de divulgar seu trabalho constantemente e monetizar todo e qualquer tipo de hobby, destruiu o conceito de repouso.
aqui está uma coisa com a qual nossos pais não precisaram lidar, uma que mudou radicalmente as regras do jogo: a internet.
as redes sociais e tudo o que fizemos com elas (ou que elas fizeram com a gente), influenciou nossa ideia de descanso.
eu luto contra o descanso produtivo desde a adolescência.
me lembro de estar desde muito nova sempre estudando, produzindo, aprendendo, correndo em direção ao alguém que eu queria ser, uma versão melhorada de mim que nunca chegava.
a internet deixou minha versão melhorada cada vez mais longe, mais difícil de ser alcançada. ela se transformou na fusão das rotinas perfeitas que apareciam no meu feed, nos corpos mais magros que o meu, nas coisas que eu não podia comprar.
ao abrir o Instagram para relaxar, uma nova lista de tarefas se instalava na minha mente. “aqui estão todas as coisas que você deveria fazer para alcançar sua melhor versão, segundo as vidas de outras pessoas na internet”, minha própria voz sussurrava no meu ouvido bem baixinho.
ainda existem lugares nos quais eu quero chegar, é claro.
mas seria injusto não notar os muitos lugares que já ocupei.
no meio de todos os avisos do mundo me dizendo que ainda não estou onde deveria estar, quero me contentar em sentar confortavelmente nesse espaço que adentrei, respirar bem fundo, alongar meu corpo e sentir pela primeira vez que estou aqui, e estar é o bastante.
amanhã é um feriado nacional.
e meu mais sincero desejo é que (se possível) você se dê a chance de priorizar o descanso, escolher o tédio, esticar os pés na mesinha de centro da sala e, enquanto olhar pela janela, respirar fundo e sentir que você está ali, e estar é, finalmente, o bastante.
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🎧 esse podcast tem me feito companhia e ajudado a relaxar minha mente com conversas leves.
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🎧 uma playlist delícia pra ouvir enquanto toma um banho quentinho, passa um creme pelo corpo e prepara um chá de camomila pra ir dormir. (essa aqui foi uma indicação da
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📂 dica: os links compartilhados por aqui ficam salvos e organizados por tema no banco de teorias, o acervo de links da teoricamente :)
toda edição termina com um áudio curtinho de despedida, esse foi o de hoje:
👩🏼💻 A Teoricamente é escrita por Leticia, profissional de comunicação sempre estudando sobre futuro, comportamento e narrativa. Você pode me encontrar no LinkedIn, no Instagram e agora no Tiktok também (com mais frequência do que deveria).
“ao abrir o Instagram para relaxar, uma nova lista de tarefas se instalava na minha mente. “aqui estão todas as coisas que você deveria fazer para alcançar sua melhor versão, segundo as vidas de outras pessoas na internet”.
Esse trecho é perfeito!
Eu hoje entro no instagram, posto se tiver que postar e excluo o app. Minha relação com as redes sociais melhorou demais. a gente já se cobra tempo todo, ver a vida dos outros traz muitos pensamentos vazios, que não me levava a nada.
Amei e já coloquei na minha rotina para relaxar duas vezes na semana.